
Kathy tinha, compreensivelmente, problemas no seu casamento. Por vezes podia ser muito amorosa, mas noutras alturas era desconfiada e podia tornar-se muito crítica e temperamental. Ficava horrorizada com o modo como estava a repetir o comportamento da sua mãe, e podia ver os efeitos destructivos no seu marido.
Mas sentia-se muito estagnada, e quando este processo se desencadeava, era-lhe quase impossível não reverter para este tipo de comportamento. Sabia que assim estava a destruir a relação, e como tal recorreu a ajuda.
Em Gestalt movemo-nos em direção ao problema, em vez de nos afastarmos dele. A dificuldade de Kathy era que ela se estava a tornar naquilo que não queria ser. Vemos a resistência como parte do tema, e não queremos participar nisso ao tentar ajudar a pessoa a tornar-se diferente. Senão, estamos apenas a conspirar em trabalhar contra a resistência.
Assim, salientei que este tipo de comportamento que ela experienciava por parte da mãe era bastante sádico. Kathy concordou. Também lhe chamei a atenção de que o seu próprio comportamento tinha igualmente essas características. Foram palavras duras, mas Kathy pôde ver a validade nesta forma de nomear o que estava a suceder.
Convidei-a pois a entrar nessa parte através de uma experiência. Pedi-lhe que dissesse simplesmente a frase ´Quero que sintas a dor que eu estou a sentir´. Esta frase dava nome à dinâmica relacional subjacente ao sadismo. Tanto a sua mãe, como agora também Kathy, estavam envolvidas em muita dor, e o comportamento sádico continha um anelo subjacente.
Kathy experimentou esta frase, apesar de a achar difícil, e sentiu de imediato a verdade que continha.
Ao entrar no seu sadismo desta forma, podia apropriar-se dele.
Tornei de seguida a experiência mais difícil ao pedir-lhe que se imaginasse a falar com o seu marido numa altura em que se encontrasse de mau humor. Repetiu a mesma frase. Perguntei-lhe como se sentia no seu corpo, para enraizar a experiência.
Sentia-se muito nauseada, uma mistura de ódio, vergonha e prazer.
Experiencialmente, este era o cerne da questão. Ao entrar directamente no sadismo, e nos sentimentos que o acompanham, pudémos chegar às dinâmicas nucleares da questão, de uma forma vivencial em vez de nos limitarmos a descrever o que se passava. Ao colocar Kathy no centro da experiência, a possibilidade de uma escolha existencial torna-se assim evidente.
Convidei-a de seguida a respirar, para se centrar. O próximo passo seria pedir-lhe que imaginasse a mãe, exibindo um sorrio sádico. Novamente, sentiu a ansiedade, tensão e náusea. Pedi-lhe que lhe ocorresse uma imagem que a pudesse fortalecer - pensou no Buda. Tal acalmou-a.
Guiei-a então entre vizualisar a mãe, sentir os sentimentos e ver o Buda, acalmando-se.
Pedi-lhe que proferisse uma afirmação à sua mãe: ´Estou conectada contigo quando sou sádica´.
Isto introduziu um outro aspecto da dinâmica relacional, em que fazíamos referência a todo o campo - passado e presente tornavam-se unos. O próprio acto de ser sádica, unia Kathy à sua mãe de uma forma que ela não conseguiria de outra maneira. É deste modo que nos tornamos naquilo a que queremos resistir.
Ao fazer este processo, apropriando-se do seu comportamento sádico, apropriando-se da sua ligação com a mãe, e ao mesmo tempo sentindo os seus próprios sentimentos e encontrando uma imagem tranquilizadora, ela foi capaz de introduzir inovação na relação e no seu comportamento.
Sentiu-se aliviada, e de alguma forma renovada pelo trabalho. Pedi-lhe que praticasse sempre que esses sentimentos tomassem conta dela.
Sem comentários:
Enviar um comentário