sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015
Case #56 - A menina necessita atenção
Wendy falou-me a respeito de querer um companheiro. Estava divorciada e geria uma empresa. Contou-me a quão impaciente era para com os seus empregados, de como era muito eficiente e nunca mostrava a sua vulnerabilidade. Contrastou tudo isto com a paciência que reconhecia em mim.
Debati temas de poder com ela - a capacidade de ser eficiente e directa, o prazer de estar no controlo, ser a chefe.
Parecia muito acanhada enquanto eu falava, remexendo as mãos... fazia-me lembrar uma menina. Perguntei-lhe a idade que sentia ter - disse-me 10 anos, e então indaguei a respeito do que lhe tinha acontecido nessa idade.
Perguntei-lhe sobre paciência na sua família. O pai tiha-a esbofeteado quando ela tinha 10 anos porque as suas notas na escola tinham descido. De facto, ele batia regularmente no seu irmão mais novo. Mas em público, era um homem paciente, que tinha tempo para dedicar às pessoas.
Chamei a atenção para o facto da paciência que ela via em mim como terapeuta a poder deixar desconfiada pois a questão que se punha era: será que eu iria explodir como o seu pai?
Ela concordou. Disse-me que o problema era que ela não tinha muita confiança nos homens. O seu primeiro marido também era impaciente com ela, apenas interessado naquilo que ela poderia fazer por ele. Disse-me que apenas queria encontrar outro companheiro.
Revelou-me que a razão pela qual as suas notas tinham descido era porque estava num colégio interno, no qual era vítima de abusos, muito frequentes e maldosos. Os seus pais não sabiam disso, além de não se interessarem. Ela sentia-se muito sozinha.
Sentei-me perto dela, falei com ela, reconhecendo a sua sensibilidade, a sua vulnerabilidade, e a sua necessidade, enquanto criança, de ser vista como a pessoa que era, ao invés de fazer parte dos planos que tinham para ela. Alguém que se interessasse pelos seus problemas, em vez de apenas querer saber das sua notas.
Começou a chorar, suavizando-se ainda mais. Declarei-lhe o meu interesse nela, sem segundas intenções de querer que ela fosse uma pessoa diferente. Parecia faminta por este tipo de atenção, e deixámo-nos estar sentados por algum tempo, enquanto eu a encorajava a absorver esta experiência.
Salientei que esta parte sua necessitava cuidado, atenção, e crescer de uma forma natural, antes de ela desenvolver um núcleo mais forte com o qual estar numa relação.
Em Gestalt não nos deixamos levar simplestemente pelo tema que o cliente nos apresenta - o que também é importante é aquilo que eu me dou conta como terapeuta - algo com o qual o cliente pode não estar de todo em contacto. Trazemos então isso completamente para a tomada de consciência no presente, e exploramos o contexto - geralmente a família, mas nem sempre. Essa informação do Campo é então trazida de volta ao momento presente, e à relação terapêutica.
Fazer isto fornece neste caso uma agenda terapêutica clara, um processo pelo qual pudémos continuar a trabalhar no tema inicialmente apresentado por ela - querer um outro companheiro.
Debati temas de poder com ela - a capacidade de ser eficiente e directa, o prazer de estar no controlo, ser a chefe.
Parecia muito acanhada enquanto eu falava, remexendo as mãos... fazia-me lembrar uma menina. Perguntei-lhe a idade que sentia ter - disse-me 10 anos, e então indaguei a respeito do que lhe tinha acontecido nessa idade.
Perguntei-lhe sobre paciência na sua família. O pai tiha-a esbofeteado quando ela tinha 10 anos porque as suas notas na escola tinham descido. De facto, ele batia regularmente no seu irmão mais novo. Mas em público, era um homem paciente, que tinha tempo para dedicar às pessoas.
Chamei a atenção para o facto da paciência que ela via em mim como terapeuta a poder deixar desconfiada pois a questão que se punha era: será que eu iria explodir como o seu pai?
Ela concordou. Disse-me que o problema era que ela não tinha muita confiança nos homens. O seu primeiro marido também era impaciente com ela, apenas interessado naquilo que ela poderia fazer por ele. Disse-me que apenas queria encontrar outro companheiro.
Revelou-me que a razão pela qual as suas notas tinham descido era porque estava num colégio interno, no qual era vítima de abusos, muito frequentes e maldosos. Os seus pais não sabiam disso, além de não se interessarem. Ela sentia-se muito sozinha.
Sentei-me perto dela, falei com ela, reconhecendo a sua sensibilidade, a sua vulnerabilidade, e a sua necessidade, enquanto criança, de ser vista como a pessoa que era, ao invés de fazer parte dos planos que tinham para ela. Alguém que se interessasse pelos seus problemas, em vez de apenas querer saber das sua notas.
Começou a chorar, suavizando-se ainda mais. Declarei-lhe o meu interesse nela, sem segundas intenções de querer que ela fosse uma pessoa diferente. Parecia faminta por este tipo de atenção, e deixámo-nos estar sentados por algum tempo, enquanto eu a encorajava a absorver esta experiência.
Salientei que esta parte sua necessitava cuidado, atenção, e crescer de uma forma natural, antes de ela desenvolver um núcleo mais forte com o qual estar numa relação.
Em Gestalt não nos deixamos levar simplestemente pelo tema que o cliente nos apresenta - o que também é importante é aquilo que eu me dou conta como terapeuta - algo com o qual o cliente pode não estar de todo em contacto. Trazemos então isso completamente para a tomada de consciência no presente, e exploramos o contexto - geralmente a família, mas nem sempre. Essa informação do Campo é então trazida de volta ao momento presente, e à relação terapêutica.
Fazer isto fornece neste caso uma agenda terapêutica clara, um processo pelo qual pudémos continuar a trabalhar no tema inicialmente apresentado por ela - querer um outro companheiro.
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2015
Case #55 - O vazio criativo
Betina contou-me a respeito de ter medo que o marido morresse - havia um historial de mortes precoces na família dele, um cartomante tinha-lhe dito que ele poderia morrer, e ele ficava acordado até tarde todas as noites.
Enquanto conversámos, tornou-se claro que o tema era que ele a negligenciava - ficando fora de casa até horas tardias todas as noites, bebendo e jogando com os seus amigos; quando voltava para casa, mostrava-se barulhento e desconsiderado, acordando-a. Passava pouco tempo com a família, e tinha gasto poupanças familiares no jogo.
Isto tinha-se passado durante a maior parte do seu casamento, há já várias décadas. Nos sistemas familiares que têm um elemento abusivo, que se mantém por algum tempo, há um aspecto da dinâmica que é co-criado, geralmente relacionado com o contexto no Campo.
Actualmente, ela andava zangada, mas eles raramente falavam um com o outro.
Assinalei que juntamente com a dor que sentiria se ele morresse, provavelmente também se sentiria aliviada. Ela concordou. Em Gestalt estamos interessados em ambos os extremos de uma polaridade.
Perguntei-lhe o que desejava ela da minha parte - respondeu-me que queria alguma orientação em relação ao que fazer.
Também me revelou que o seu pai tinha tido um comportamente parecido - passando tempo fora de casa até noite tardia, a jogar. Essa era a indicação do campo.
Tornou-se claro para mim que esta era uma situação séria, arraigada e muito debilitante.
O seu marido tinha confidenciado com a sua cunhada, que depois criticara Betina.
Enquanto me contava acerca disto, notei que se beliscava. Convidei-a então a ´beliscar´ a sua cunhada, e pus uma almofada diante dela. Mostrou-se muito relutante, beliscando-se a si própria ainda com mais força. Fui um pouco intrometido - insisti que ela experimentasse na almofada - salientando que era ´apenas uma almofada´ e que não haveria repercussões. Foi difícil para ela, mas acabou por fazê-lo, enfiando os dedos na almofada. A isto chamamos ´retroflexão´ em Gestalt - fazer a si próprio o que se gostaria de fazer a outrem.
Convidei-a a usar palavras também. Foi então que me revelou que os seus irmãos também se intrometiam no assunto e a criticavam.
Nesse momento parei o que estávamos a fazer. Todo o processo revelou uma impotência arraigada, falta de apoio e um padrão intergeracional com as características de uma relação abusiva. Não era algo que pudesse ser resolvido comigo a dar indicações simples do género ´não faças isso´. Além de que a quantidade de apoio necessária para sair dessa situação parecia gigantesca, e irrealista de se tentar numa única sessão - é importante reconhecer as nossas limitações como terapeutas, e não tentar algo que dê falsas esperanças.
Aumentei então a sua tomada de consciência indo noutra direcção. Perguntei-lhe se achava que todos os homens eram egoístas, ao que me respondeu que não. Partilhei então com ela que eu sim achava que os homens eram um pouco egoístas. Respondeu-me - ´Bem, eu deixo que o sejam´. Desta forma, ela deu um passo em direção a assumir alguma responsabilidade, sem que eu a tivesse que ´confrontar´.
Olhei para ela, e disse-lhe que podia ver quão infeliz ela estava. Foi um momento de encontro. Eu não a queria salvar do local em que se encontrava ou solucionar o que quer que fosse - embora claro que queria uma vida diferente para ela.
Sentei-me com ela, nesse local. Dei nome àquilo que via - uma situação que era também familiar à experiência da sua mãe. Uma situação que se alastrava há décadas. Uma situação que parecia apenas ir de mal a pior. Uma situação em que se encontrava estagnada, apesar de ter algum conhecimento psicológico.
Destacar a natureza depressiva da situação foi uma forma de não a minimizar. Não comentei, julguei ou sugeri, apenas reconheci. Desta forma, eu podia vê-la, e sentar-me ao seu lado, olhando para a realidade de como as coisas são.
Em Gestalt chamamos a isto ´sentar-se com o vazio criativo´. Não parece criativo, mas pelo facto de nos sentarmos com ele, sem nos afundarmos ou fugirmos, algo diferente pode emergir.
Ela disse, ´Bom, nós deixámos de falar um com o outro, e isso é um pequeno alívio´. Eu entendi - e salientei que, de facto, o casamento tinha morrido. E posto isto, que se segue?
Perguntei-lhe qual a percentagem que ela achava que havia de alguma esperança de mudança. Estava à espera de um valor extremamente baixo. Se me tivesse dito zero, teria trabalhado com ela no sentido de como sair de lá.
Mas surpreendeu-me ao dizer 15%,o que indicava haver uma hipótese de as coisas puderem mudar.
Perguntei-lhe o que isso lhe permitia fazer - aqui estava a porta de entrada para a possibilidade de acção.
Disse que podia descobrir maneiras de ser mais feliz. Isto era algo bom - uma solução subjectiva para começar.
Quando lhe perguntei que outras coisas poderia fazer, disse-me que se podia dedicar mais aos filhos, mas eu salientei que isso era o que ela já fazia para lidar com o casamento.
Identificou outras formas de como ser mais feliz. Mas eu queria mais da parte dela - algumas acções objectivas que poderia tomar para mudar a relação.
Contou-me que o marido se queixava que ela já não preparava o pequeno-almoço. Assim sendo, ele ainda queria algum cuidado, e sentia saudades disso.
Perguntei-lhe então que ´quid pro quo´ ela lhe poderia pedir, caso lhe fizesse o pequeno-almoço. Respondeu-me, ´tempo com a família´. Soou-me como um bom começo - não muito íntimo, mas um sinal de algo diferente. Pedi-lhe que quantificasse quanto queria e com que frequência. Sugeri-lhe então que ela se oferecesse para fazer pequeno-almoço esse número de vezes.
Salientei que se ela queria criar uma nova relação a partir das cinzas, isso levaria vários anos, e iria necessitar de muito apoio ao longo do processo.
Em Gestalt, ficamos satisfeitos com um pequeno passo - integrado - de cada vez.
Neste caso, algo emergira do vazio, e fora tudo obra dela, ao invés do seu convite inicial a que eu lhe dissesse o que fazer. A minha ´orientação´ foi antes de mais dirigir a sua atenção para o ´que existe´, e em seguida ajudá-la a enraizar-se na figura emergente daquilo que tinha de facto energia para fazer.
Enquanto conversámos, tornou-se claro que o tema era que ele a negligenciava - ficando fora de casa até horas tardias todas as noites, bebendo e jogando com os seus amigos; quando voltava para casa, mostrava-se barulhento e desconsiderado, acordando-a. Passava pouco tempo com a família, e tinha gasto poupanças familiares no jogo.
Isto tinha-se passado durante a maior parte do seu casamento, há já várias décadas. Nos sistemas familiares que têm um elemento abusivo, que se mantém por algum tempo, há um aspecto da dinâmica que é co-criado, geralmente relacionado com o contexto no Campo.
Actualmente, ela andava zangada, mas eles raramente falavam um com o outro.
Assinalei que juntamente com a dor que sentiria se ele morresse, provavelmente também se sentiria aliviada. Ela concordou. Em Gestalt estamos interessados em ambos os extremos de uma polaridade.
Perguntei-lhe o que desejava ela da minha parte - respondeu-me que queria alguma orientação em relação ao que fazer.
Também me revelou que o seu pai tinha tido um comportamente parecido - passando tempo fora de casa até noite tardia, a jogar. Essa era a indicação do campo.
Tornou-se claro para mim que esta era uma situação séria, arraigada e muito debilitante.
O seu marido tinha confidenciado com a sua cunhada, que depois criticara Betina.
Enquanto me contava acerca disto, notei que se beliscava. Convidei-a então a ´beliscar´ a sua cunhada, e pus uma almofada diante dela. Mostrou-se muito relutante, beliscando-se a si própria ainda com mais força. Fui um pouco intrometido - insisti que ela experimentasse na almofada - salientando que era ´apenas uma almofada´ e que não haveria repercussões. Foi difícil para ela, mas acabou por fazê-lo, enfiando os dedos na almofada. A isto chamamos ´retroflexão´ em Gestalt - fazer a si próprio o que se gostaria de fazer a outrem.
Convidei-a a usar palavras também. Foi então que me revelou que os seus irmãos também se intrometiam no assunto e a criticavam.
Nesse momento parei o que estávamos a fazer. Todo o processo revelou uma impotência arraigada, falta de apoio e um padrão intergeracional com as características de uma relação abusiva. Não era algo que pudesse ser resolvido comigo a dar indicações simples do género ´não faças isso´. Além de que a quantidade de apoio necessária para sair dessa situação parecia gigantesca, e irrealista de se tentar numa única sessão - é importante reconhecer as nossas limitações como terapeutas, e não tentar algo que dê falsas esperanças.
Aumentei então a sua tomada de consciência indo noutra direcção. Perguntei-lhe se achava que todos os homens eram egoístas, ao que me respondeu que não. Partilhei então com ela que eu sim achava que os homens eram um pouco egoístas. Respondeu-me - ´Bem, eu deixo que o sejam´. Desta forma, ela deu um passo em direção a assumir alguma responsabilidade, sem que eu a tivesse que ´confrontar´.
Olhei para ela, e disse-lhe que podia ver quão infeliz ela estava. Foi um momento de encontro. Eu não a queria salvar do local em que se encontrava ou solucionar o que quer que fosse - embora claro que queria uma vida diferente para ela.
Sentei-me com ela, nesse local. Dei nome àquilo que via - uma situação que era também familiar à experiência da sua mãe. Uma situação que se alastrava há décadas. Uma situação que parecia apenas ir de mal a pior. Uma situação em que se encontrava estagnada, apesar de ter algum conhecimento psicológico.
Destacar a natureza depressiva da situação foi uma forma de não a minimizar. Não comentei, julguei ou sugeri, apenas reconheci. Desta forma, eu podia vê-la, e sentar-me ao seu lado, olhando para a realidade de como as coisas são.
Em Gestalt chamamos a isto ´sentar-se com o vazio criativo´. Não parece criativo, mas pelo facto de nos sentarmos com ele, sem nos afundarmos ou fugirmos, algo diferente pode emergir.
Ela disse, ´Bom, nós deixámos de falar um com o outro, e isso é um pequeno alívio´. Eu entendi - e salientei que, de facto, o casamento tinha morrido. E posto isto, que se segue?
Perguntei-lhe qual a percentagem que ela achava que havia de alguma esperança de mudança. Estava à espera de um valor extremamente baixo. Se me tivesse dito zero, teria trabalhado com ela no sentido de como sair de lá.
Mas surpreendeu-me ao dizer 15%,o que indicava haver uma hipótese de as coisas puderem mudar.
Perguntei-lhe o que isso lhe permitia fazer - aqui estava a porta de entrada para a possibilidade de acção.
Disse que podia descobrir maneiras de ser mais feliz. Isto era algo bom - uma solução subjectiva para começar.
Quando lhe perguntei que outras coisas poderia fazer, disse-me que se podia dedicar mais aos filhos, mas eu salientei que isso era o que ela já fazia para lidar com o casamento.
Identificou outras formas de como ser mais feliz. Mas eu queria mais da parte dela - algumas acções objectivas que poderia tomar para mudar a relação.
Contou-me que o marido se queixava que ela já não preparava o pequeno-almoço. Assim sendo, ele ainda queria algum cuidado, e sentia saudades disso.
Perguntei-lhe então que ´quid pro quo´ ela lhe poderia pedir, caso lhe fizesse o pequeno-almoço. Respondeu-me, ´tempo com a família´. Soou-me como um bom começo - não muito íntimo, mas um sinal de algo diferente. Pedi-lhe que quantificasse quanto queria e com que frequência. Sugeri-lhe então que ela se oferecesse para fazer pequeno-almoço esse número de vezes.
Salientei que se ela queria criar uma nova relação a partir das cinzas, isso levaria vários anos, e iria necessitar de muito apoio ao longo do processo.
Em Gestalt, ficamos satisfeitos com um pequeno passo - integrado - de cada vez.
Neste caso, algo emergira do vazio, e fora tudo obra dela, ao invés do seu convite inicial a que eu lhe dissesse o que fazer. A minha ´orientação´ foi antes de mais dirigir a sua atenção para o ´que existe´, e em seguida ajudá-la a enraizar-se na figura emergente daquilo que tinha de facto energia para fazer.
segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015
Case #54 - Aproximando Deus e o diabo.
Angelica era médica, apesar de ter mudado de profissão recentemente. Tinha um filho e desejava outro, mas também estava muito assustada com ter mais. Disse-me, à medida que fomos estabelecendo contacto, que estava preocupada com a forma como era vista aos meus olhos. Fui-lhe dizendo o que observava na realidade, para criar uma base para a relação... incluindo uma linda bracelete que ela usava, oferecida pelo marido.
Tinha sido ginecologista, e como parte do seu trabalho, tinha realizado abortos. Nessa altura, não sentia nada ao fazê-lo, era apenas o seu trabalho. Mas na verdade, também não sentia realmente alegria quando ajudava a dar à luz um bebé - era igualmente apenas parte do seu trabalho.
Anos mais tarde, tinha começado terapia e entrado em contacto com os seus sentimentos. Isso incluiu a dor de ter realizado esses abortos. Não se prendia com crenças ou ideologia - tinha a ver com o impacto emocional de mais de uma década de bebés abortados.
Mais recentemente, tinha tido um aborto espontâneo, e viu-o como uma espécie de castigo. Relatou-me que sentia dor de cabeça, mas que o resto do corpo estava entorpecido. Foi muito intenso para ela falar disto, estava a chorar. Sugeri-lhe uma pausa. Quando há demasiados sentimentos para a pessoa integrar, interrompe-se o processo. Assim, aprofundar a terapia nem sempre é algo bom. A pausa permitiu-nos dar um passo atrás, e eu estabeleci um contacto relacional, contando-lhe de como a via nos meus olhos - sentia uma grande compaixão por ela, e não tinha julgamentos negativos. Ela tranquilizou-se um pouco.
Perguntei-lhe o que sentia no seu ventre. Respondeu-me - negrume. Uma vez mais, a intensidade foi demasiado para ela. Estava a retirar-se. Pedi-lhe então que estabelecesse contacto visual - caso contrário ficaria num sistema fechado. Disse-lhe que a sua bracelete fazia-me pensar que haveria certamente mais cores nela - a bracelete tinha algumas contas negras, mas também alguns cristais, e uma linda forma rosada. Referi que o cor-de-rosa seria parecido à cor do seu útero - como médica ela sabia que isto era verdade. Ao fazer isto enraizei-a em algo mais sólido que a sua projecção ´negra´, e conduzia-a em direcção ao sentimento da vida e do sangue.
Enquanto falávamos, ela cerrava os seus punhos. Fiz-lho notar - direcionamos a tomada de consciência para pontos chave da expressão da energia, ajudando a que possam emergir mais completamente.
Disse-me sentir raiva, o que aconteceu diversas vezes durante a nosssa conversa. É aquilo que em Gestalt se chama ´figura emergente´, algo paralelo ao tema presente. Pode ser focado, ou exagerado.
Contou-me que se sentia como se estivesse num local escuro, e queria escapar.
A raiva é então uma indicação da energia dinâmica que ela precisava para criar alguma mudança. Mas sugerir apenas algo como bater em almofadas não é necessariamente aquilo que um cliente necessita.
Indguei com quem estaria ela raivosa - consigo própria, respondeu-me.
Perguntei-lhe o que diria a si mesma. Disse-me sentir-se como o diabo, e continuou dizendo a si própria quão má pessoa era, e como merecia não ter mais filhos.
Uma vez mais, convidei-a a fazer uma pausa - eram temas muito dolorosos.
Perguntei-lhe se tinha alguma crença espiritual. Respondeu-me que não.
Salientei que se ela acreditava num diabo, deveria existir algures um deus. Eu andava em busca de algum tipo de redenção neste lugar infernal. Estava a destacar a natureza das polaridades - parte da orientação Gestalt com vista ao holismo.
Ela concordou. Pedi-lhe então que selecionasse dois objectos, representando deus e o diabo.
Agarrou-se ao diabo, mas depois colocou-o ao lado do símbolo de deus. Disse que o deus estava adormecido, e queria acordá-lo. Estava a bater no chão, mas o símbolo continuava a tombar. Ela queria que se mantivesse de pé por si próprio. Foi então que eu intervim como a ´força divina´ e coloquei-o numa posição erecta.
Convidei-a a ser receptiva à figura de deus. Subitamente sentiu-se cansada. Sugeriu-lhe então que fizesse uma pequena sesta. À medida que se encostou a mim, sugeri-lhe que quando acordasse pudesse sentir a força vital a agitar-se no seu ventre.
Descansou por uns minutos, e de seguida abriu os olhos. Estava de facto disponível para receber a benção de vida do símbolo de deus. Sentia calor no seu corpo, e uma sensação agradável no seu ventre. Colocou então o ´diabo´ atrás do ´deus´... um símbolo perfeito de integração. Reconheceu que na força diabólica havia um certo tipo de poder que ela podia usar.
Em Gestalt tratamos sempre de dar corpo a coisas abstractas, que neste caso era a polaridade. Ela precisava do tipo adequado de apoio para poder então atingir o objectivo - integração.
Tinha sido ginecologista, e como parte do seu trabalho, tinha realizado abortos. Nessa altura, não sentia nada ao fazê-lo, era apenas o seu trabalho. Mas na verdade, também não sentia realmente alegria quando ajudava a dar à luz um bebé - era igualmente apenas parte do seu trabalho.
Anos mais tarde, tinha começado terapia e entrado em contacto com os seus sentimentos. Isso incluiu a dor de ter realizado esses abortos. Não se prendia com crenças ou ideologia - tinha a ver com o impacto emocional de mais de uma década de bebés abortados.
Mais recentemente, tinha tido um aborto espontâneo, e viu-o como uma espécie de castigo. Relatou-me que sentia dor de cabeça, mas que o resto do corpo estava entorpecido. Foi muito intenso para ela falar disto, estava a chorar. Sugeri-lhe uma pausa. Quando há demasiados sentimentos para a pessoa integrar, interrompe-se o processo. Assim, aprofundar a terapia nem sempre é algo bom. A pausa permitiu-nos dar um passo atrás, e eu estabeleci um contacto relacional, contando-lhe de como a via nos meus olhos - sentia uma grande compaixão por ela, e não tinha julgamentos negativos. Ela tranquilizou-se um pouco.
Perguntei-lhe o que sentia no seu ventre. Respondeu-me - negrume. Uma vez mais, a intensidade foi demasiado para ela. Estava a retirar-se. Pedi-lhe então que estabelecesse contacto visual - caso contrário ficaria num sistema fechado. Disse-lhe que a sua bracelete fazia-me pensar que haveria certamente mais cores nela - a bracelete tinha algumas contas negras, mas também alguns cristais, e uma linda forma rosada. Referi que o cor-de-rosa seria parecido à cor do seu útero - como médica ela sabia que isto era verdade. Ao fazer isto enraizei-a em algo mais sólido que a sua projecção ´negra´, e conduzia-a em direcção ao sentimento da vida e do sangue.
Enquanto falávamos, ela cerrava os seus punhos. Fiz-lho notar - direcionamos a tomada de consciência para pontos chave da expressão da energia, ajudando a que possam emergir mais completamente.
Disse-me sentir raiva, o que aconteceu diversas vezes durante a nosssa conversa. É aquilo que em Gestalt se chama ´figura emergente´, algo paralelo ao tema presente. Pode ser focado, ou exagerado.
Contou-me que se sentia como se estivesse num local escuro, e queria escapar.
A raiva é então uma indicação da energia dinâmica que ela precisava para criar alguma mudança. Mas sugerir apenas algo como bater em almofadas não é necessariamente aquilo que um cliente necessita.
Indguei com quem estaria ela raivosa - consigo própria, respondeu-me.
Perguntei-lhe o que diria a si mesma. Disse-me sentir-se como o diabo, e continuou dizendo a si própria quão má pessoa era, e como merecia não ter mais filhos.
Uma vez mais, convidei-a a fazer uma pausa - eram temas muito dolorosos.
Perguntei-lhe se tinha alguma crença espiritual. Respondeu-me que não.
Salientei que se ela acreditava num diabo, deveria existir algures um deus. Eu andava em busca de algum tipo de redenção neste lugar infernal. Estava a destacar a natureza das polaridades - parte da orientação Gestalt com vista ao holismo.
Ela concordou. Pedi-lhe então que selecionasse dois objectos, representando deus e o diabo.
Agarrou-se ao diabo, mas depois colocou-o ao lado do símbolo de deus. Disse que o deus estava adormecido, e queria acordá-lo. Estava a bater no chão, mas o símbolo continuava a tombar. Ela queria que se mantivesse de pé por si próprio. Foi então que eu intervim como a ´força divina´ e coloquei-o numa posição erecta.
Convidei-a a ser receptiva à figura de deus. Subitamente sentiu-se cansada. Sugeriu-lhe então que fizesse uma pequena sesta. À medida que se encostou a mim, sugeri-lhe que quando acordasse pudesse sentir a força vital a agitar-se no seu ventre.
Descansou por uns minutos, e de seguida abriu os olhos. Estava de facto disponível para receber a benção de vida do símbolo de deus. Sentia calor no seu corpo, e uma sensação agradável no seu ventre. Colocou então o ´diabo´ atrás do ´deus´... um símbolo perfeito de integração. Reconheceu que na força diabólica havia um certo tipo de poder que ela podia usar.
Em Gestalt tratamos sempre de dar corpo a coisas abstractas, que neste caso era a polaridade. Ela precisava do tipo adequado de apoio para poder então atingir o objectivo - integração.
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